segunda-feira, junho 02, 2008

Temas para discussâo

Gente,

Com as políticas públicas deste país gerando, todos os dias, tantos temas para discussão, como pode este espaço estar vazio há tanto tempo?

É só escolher... temos um fundo soberano que mal foi anunciado e já está sendo "abafado", tem a caótica política ambiental do país (com todos os custos que ela gera), tem a infindável discussão da política tributária (e a inevitável questão acerca da necessidade, ou não, de uma nova contribuição para a saúde)... ainda no âmbito da política tributária, poderíamos discutir o estudo do IPEA que indica a regressividade de nossa carga tributária (mas aí, caros colegas, teríamos que colocar as transferências também na conta, e fazer um estudo um pouco mais honesto).

Voltando à energia, temos tanto a questão das opções de política energética para a energia elétrica (e o problema que a opção pelas térmicas gera ao colidir com a "imaturidade" da nossa indústria de gás), e temos as perspectivas das áreas do pré-sal colocando as reservas brasileiras entre as maiores do mundo.

Poderíamos, também, discutir uma questão que sempre me impressiona: em termos de avaliação de política, as políticas sociais são sempre mais avaliadas e estudadas do que as demais políticas públicas (econômicas e industriais, inclusive)... Por que isso? Será que o gasto em políticas sociais precisa realmente ser tão mais justificado? Naminha opinião, o que há é uma tremenda lacuna na avaliação das demais políticas, em especial das políticas econômicas.

quarta-feira, abril 16, 2008

Royalties e outras coisas

Então,

Voltando ao tema da aplicação dos recursos provenientes dos royalties e participações especiais do petróleo, essa semana os jornais publicaram um estudo coordenado por professores da UCAM indicando um crescimento absurdo dos gastos com pessoal nos municípios beneficiados pelo pagamento de royalties.

Mas aí me vem a dúvida: esse tipo de indicador é válido? Isto porque a crítica tradicionalmente indica como alternativa investimentos em saúde e educação, mas uma vez construídas as escolas e hospitais, as prefeituras tem que contratar os profissionais para trabalhar nestas áreas (o que parece banstante óbvio), ampliando, consequentemente, os gastos com saúde e educação.

Assim, caso o indicador "aumento da folha de pessoal" seja utilizado, não deveria haver um filtro que evitasse esse tipo de problema? Ou não?

quinta-feira, novembro 15, 2007

Petroleo eh nosso (cont)

Helo, excelentes clarificacoes, eh otimo contar com uma especialista numa hora dessas :)

Pergunta: Voce tem ideia do quanto esse dinheiro poderia representar em termos do orcamento anual do governo?

Pessoalmente eu acho que quanto menos discricao for dada ao governo no uso desse dinheiro melhor. Desse ponto de vista nada melhor do que fazer uma distribuicao "lump sum" pra toda a populacao, estilo Alaska/Suplicy. Imposto de renda negativo mesmo. Afinal, o governo eh o acionista majoritario da empresa e numa democracia cada cidadao eh um "acionista" do governo. Que se distribua como dividendo.

Gasto em infra estrutura, educacao, saude, programas sociais tudo isso acho muito importante, mas me incomoda financia-los com um "windfall" como esse. O incentivo para faze-los da forma mais racional e eficiente eh minimo, como alias eh o incentivo para o governo manter a economia em ordem de forma a garantir arrecadacao.

Resumindo, que bom sera se os brasileiros puderem ter essa renda extra. Mas que recebam-na diretamente e depois decidam o que fazer com ela (inclusive, se for o caso, pagar mais impostos), e o governo que batalhe para garantir os recursos que necessita para os usos que o legitima.

segunda-feira, novembro 12, 2007

O Petróleo é nosso ????

Vamos lá...

Antes de discutirmos o que fazer com eventuais aportes de recursos que virão do ultra-mega-maravilhoso campo de Tupi, temos que esclarecer algumas coisas...

Em primeiro lugar: o campo é apenas uma hipótese. Uma hipótese super-inflada de expectativas de um governo que confunde o interesse público com os interesses de uma empresa privada, marca uma reunião do Conselho Nacional de Política Energética na sede de uma empresa regulada e arma um show danado para:
a) Reverter os danos à imagem do governo e da empresa devido à crise do gás;
b) Auferir ganhos políticos com um factóide;
c) Encher os bolsos de meia dúzia de pessoas com informações privilegiadas (alguém reparou no que aconteceu no mercado de opções);
d) Se prestar aos interesses de uma empresa privada que não quer participar de leilões públicos para concessão de licenças exploratórias, mas sim ganhar diversos blocos na surdina, de modo ilegal e de graça.

Continuando: indícios de que há petróleo naquela área existem há mais de um ano... tanto que quando saiu o edital da Rodada de Licitações da ANP a Petrobrás reclamou dizendo que talvez tivesse encontrado petróleo em campos próximos. Não houve nada de novo que justificasse o estardalhaço (além, é claro, da necessidade que o governo tinha de desviar o foco do debate acerca da ausência de investimentos e do risco real de novo racionamento de eletricidade).

Mais além: encontrou-se petróleo, mas o campo ainda está em processo de delimitação. Isso é um processo longo, incerto, e recheado de hipóteses (o campo pode ser do tamanho anunciado, o que é a hipótese otimista, ser mais discreto - hipótese realista -, ou, ainda, ser tão pequeno ou inacessível que não será explorado).

É claro que ninguém lembra que no início de do governo tinha sido descoberto um Campo em Marlim do qual agora ninguém fala... (segundo informes discretos do site da Petrobras há, aparentemente, uma camada de sal atrapalhando a exploração) ou que há uns dois anos uma suposta mega reserva de gás apareceu em Campos (e depois a Petrobras postou no site dela alguns comunicados escondidos reduzindo o tamanho da reserva para um tamanho infinitamente menor àquele originalmente anunciado).

Enfim, se houver petróleo, nada garante que ele poderá ser explorado... principalmente porque hoje não existe tecnologia capaz de colocar em produção um poço em lâmina d'água tão profunda (a tecnologia existente não está nem perto, ainda).

Agora: palhaçada como a que foi feita na semana passada, que só se prestou a enganar a população e gerar prejuízos para empresas privadas que achavam que o Brasil era um país sério eu acho que passa dos limites. É perigoso enveredarmos pelo caminho do populismo de imprensa da Bolívia e da Venezuela... e só o que o país perdeu de investimentos desde que o atual governo assumiu e passou a "melar" as rodadas de licitação de blocos exploratórios é uma vergonha.

Adicionalmente, o anúncio feriu todas as boas práticas do mercado financeiro (fora a meia dúzia de regulamentos que violou diretamente) e colocou a CVM em uma tremenda saia justa (porque terá que investigar isso e vai, obviamente, chegar a uma conclusão que isente o governo e a Petrobras, por mais suspeitoo que isso seja)

Ufa. Finalmente cheguei ao ponto que queria antes de responder ao post do Felipe... Peço desculpas pelo longo desabafo inicial.

É realmente necessária uma discussão acerca do que fazer com os royalties e demais participações decorrentes da exploração de hidrocarbonetos. No Brasil o dinheiro vai para o buraco negro do caixa único do Tesouro (em todas as instâncias federativas, por sinal)... e apenas alguns municípios o investem em áreas que geram melhoriam de bem-estar para a população. No governo federal é utilizado basicamente para geração de superávit primário.

A Lei do Petróleo, quanto a isso, prevê apenas uma parcela que deveria ser aplicada em P&D e no mapeamento do potencial geológico nacional, mas desde 2003 a lei vem sido descumprida e nem esse percentual é devidamente aplicado.

Independente de haver aumento arrecadatório (no longo prazo, diga-se de passagem, já que se houver petróleo e se houver viabilidade técnica e econômica para explorá-lo, isso só acontecerá, na melhor das hipóteses, daqui a 6/7 anos), agora é o momento de discutir uma melhor aplicação para os recursos (porque quando a arrecadação aumentar nenhum governo vai querer abrir mão de recursos desvinculados).

Pessoalmente, eu acho que o dinheiro deveria ser investido em obras de infra-estrutura, um dos grandes gargalos do país. Não digo para investir em saúde e educação porque eu acho que o sistema atual do Brasil está viciado e um aporte de recursos sem algumas reformas será ineficaz (ok, isso é discussão para outro momento). E também não acho que esses recursos devam ser direcionados para programas do tipo Bolsa Família e Fome Zero (mal desenhados, mal implementados e mal fiscalizados... mas ok, isso também é discussão para outro dia).

sexta-feira, novembro 09, 2007

O Petróleo é nosso?

A grande notícia da semana é o novo achado da Petrobrás que sozinho já aumenta as reservas provadas do país em 50%. A Petrobrás anuncionou ainda que isso pode ser só um pedaço de reservas muito maiores. De acordo com o Globo isso colocaria o Brasil entre os dez maiores produtores de Petróleo do mundo com reservas entre 60 e 100 bilhões de barris. Para se ter uma idéia, por hora temos 14 bi.

Dá pra ficar um bom tempo no boteco pensando as implicações econômicas e políticas disso. Algumas perguntas:

Pra onde vai esse dinheiro? Na Noruega eles botam num fundo, no Alaska distribuem dividendos em dinheiro pros cidadãos a la Suplicy, na Venezuela o Chavez distribui pros pobres e se perpetua no poder, na Rússia o Putin usa como instrumento pra fazer política internacional, na Nigéria é de quem pegar, no México financia boa parte do gasto público e no Brasil?

Será que vamos aproveitar o windfall pra fazer investimento de longo prazo ou vai queimar tudo na fogueira política?

E a doença holandesa? Como fica a FIESP?

E o Lula? Chavez já chamou ele de magnata do petróleo. O petróleo é dele? Ou o petróleo é nosso?

Está reaberto o botequim!

segunda-feira, outubro 24, 2005

Democracia Direta ou Representativa?

Talvez mais interessante do que a discussão sobre se se devia ou não apertar um último parafuso contra o comércio legal de armas, acabando de fechá-lo, é a discussão que apareceu um pouco (mais não muito) na imprensa sobre méritos e deméritos da democracia direta. Alguns enxergam no referendo o início de uma tendência no sentido de se realizar mais consultas populares. Para citar a Teresa Cruvinel hoje no Globo:

""São muitos os parlamentares que ficaram animados com o resultado do
referendo. Querem que os eleitores também votem temas como pena de morte,
aborto e união civil. "

Por que limitar o poder das massas? Os argumentos aqui são eminentemente conservadores, o que não significa que sejam ruins. As massas se guiam por psicologia coletiva, são portanto volúveis, levando a instabilidade. Também têm pouco conhecimento dos assuntos que estão em pauta pois não se dedicam integralmente a estudá-los. Com o voto obrigatório podem vir a ser obrigadas a votar sobre assuntos no qual têm pouco interesse. Por fim, ao dar a decisão de todos os temas para a maioria corre-se o risco de se desrespeitar os direitos das minorias. O político profissional aparece como uma figura central, que por se dedicar integralmente a entender as nuances dos problemas em jogo e articular as posições dos diversos grupos de interesse, é o mais capacitado para tomar essas decisões. O que diferencia esse político de um tecnocrata, é que ele é eleito pelo voto, de modo que suas decisões tem legitimidade. Por essa visão o erro foi ter feito o referendo pra início de conversa.

Para os que defendem a democracia direta o único motivo para isso é que as elites não querem perder seu poder. O político profissional é apenas um agente de um grupo restrito, cuja campanha é financiada pelo dinheiro das grandes corporações e o povo comum não tem quem o represente. Esse resíduo de discurso marxista seja talvez o tema principal da esquerda pós-moderna. A critica à democracia representativa se encontra no discurso da Naomi Klein contra o poder das grandes corporações multinacionais, na liderança do “Não” à constituição Européia na França, no movimento de massas contra a guerra do Iraque na Inglaterra. Uma parte grande da população, principalmente na Europa, parece estar se sentindo alienada do processo político, e de forma mais aguda quando este envolve negociações internacionais. Daí a força do movimento anti-globalização. Uma interpretação do “não” no nosso referendo é que foi de uma certa forma uma expressão dessa alienação. Numa agenda mais positiva, a defesa da democracia direta aparece também na demanda de acadêmicos e ONGs por "ownership" dos programas sociais agora também encampada pelo Banco Mundial e como motivador das experiências de orçamento participativo.

O debate sobre democracia direta é antigo, e muitos dos argumentos a favor de um sistema representativo remontam da Independência dos EUA. Jefferson e seus amigos escreveram a constituição explicitamente de modo a evitar o governo direto pelas massas, incluindo os famosos “checks and balances”. Ainda assim, a democracia americana permaneceria em muitos sentidos mais direta do que as democracias européias, uma vez que essas se estabelecessem. O mais interessante é que, talvez contraditoriamente com o discurso de esquerda, em boa medida o viés conservador da política americana se dá justamente por essa maior representação das massas no processo político. Para dar um exemplo, a história de como a pena de morte foi abolida na Europa mas não nos EUA é em boa medida uma história de por um lado um movimento pela abolição liderado de cima para baixo, pelo governo, burocratas e elites intelectuais na Europa com a população desta aos poucos se afeiçoando à idéia e por outro lado um movimento freqüentemente submetido a sanção popular e rejeitado por esta nos EUA.

O que nos trás de volta ao “Não” no referendo contra as armas. Ganhou a opção conservadora no sentido americano da palavra. Minha sensação é que a política no Brasil só não é muito mais parecida com a política nos EUA porque, ao contrario de lá, no Brasil a massa, principalmente das pequenas e médias cidades do interior bem como a baixa classe média das grandes cidades não é articulada politicamente de modo que só as vozes que aparecem são das elites “liberais” (também no sentido americano da palavra). É como se a política nos EUA fosse somente a política de Nova York, Boston, Chicago, Los Angeles e São Francisco. O que nos leva de volta à observação da Teresa Cruvinel. Democracia direta parece ser um instrumento por excelência dos “conservadores sociais”, os que são contra casamento gay, aborto, proibição da venda de armas etc. Com o crescimento das Igrejas Evangélicas e a desmoralização da esquerda no governo Lula, me parece que vamos ouvir falar cada vez mais dessas coisas.


As perguntas para discussão são:

Queremos mais democracia direta, como referendos etc.?

Caso não queiramos isso, qual mecanismos são necessários para aumentar o grau de legitimidade do sistema?

Estamos preparados para viver num país onde questões sociais relevantes para o respeito à minorias como o direito de casamento de gays, a descriminalização do aborto, pena de morte e outros são submetidos à vontade de uma maioria conservadora?

E, talvez de forma mais relevante e direta: enquanto cidadãos influentes e afluentes da classe média intelectual do Rio de Janeiro, estamos preparados para que decisões importantes do nosso país sejam deixadas a cargo de uma maioria tão distante culturalmente e ideologicamente de nós?

segunda-feira, setembro 05, 2005

Olha o Garotinho!!!

A revista IstoÉ traz uma entrevista com o cientista político Wanderley Guilherme dos Santos . Na entrevista ele afirma: “Acabamos de saber que, ao investigarem o Instituto de Resseguros do Brasil (IRB) por conta do alargamento das investigações provocadas pela lógica do blefe, a grande falcatrua cometida lá ocorreu no final do período FHC. Eu duvido que o eixo do mal dos negócios das comunicações dê projeção a esse fato, apesar de comprovado pelo TCU. Duvido. Como não deu ao fato de que Marcos Valério contribuiu com caixa 2 na campanha de FHC em 1998”.

Outra afirmação a destacar do entrevistado: “. Se o Garotinho sair pelo partido (PMDB) significa não só mais tempo de tevê, como também mais diretórios, a infra-estrutura nacional do PMDB. Ele não é um candidato fácil. Se Lula e Garotinho forem para a disputa, o PSDB vai ter que brigar pelo segundo ou pelo terceiro lugar com o Garotinho. Não se deve brincar com o Garotinho. Ele derrotou o Serra em seis Estados em 2002, com um partido que não tinha estrutura nacional”. Estes prognósticos são confirmados pela última pesquisa do IBOPE . Deve causar apreensão a todo cidadão brasileiro de bom senso. A sórdida campanha contra Lula com o objetivo de inabilitá-lo como candidato à reeleição poderá ter trágico resultado para o Brasil com a eleição de Garotinho no próximo ano. Todo cidadão com um mínimo de responsabilidade cívica deve estar atento para tamanho infortúnio para o Brasil.

Wanderley Guilherme dos Santos
"A lógica do blefe"

Cientista político acusa PFL dearquitetar impeachment de Lula,prevê fenômeno Garotinho ecobra provas contra o governo
Eliane Lobato

Wanderley Guilherme dos Santos acaba de ser consagrado um dos cinco mais importantes cientistas políticos da América Latina pela Universidade Autônoma Nacional do México. Esta é apenas mais uma condecoração deste carioca graduado em filosofia, Ph.D. em ciência política pela Universidade de Stanford e laureado pela Guggenheim Foundation. Mas uma distinção merece destaque: ele antecipou o golpe que derrubou o presidente João Goulart, em 1964, no livro Quem vai dar o golpe no Brasil. Aconselha-se, portanto, a prestar atenção em seus prognósticos. Agora, prevê que o PFL possa capitanear um pedido de impedimento do presidente Lula no fim deste ano para que ele enfrente as próximas disputas eleitorais nessa vulnerável condição. Ele afirmou que quem desconsidera “o vetor Garotinho” não está compreendendo bem a dinâmica da competição presidencial e defendeu que os deputados e senadores que não provarem suas acusações deveriam ser submetidos à comissão de ética e perder o mandato. Wanderley Guilherme dos Santos não busca meias palavras para expor ou fundamentar seu pensamento.

ISTOÉ – Como será a disputa presidencial em 2006? O caixa 2 vai deixarde existir ou será maquiado?
Wanderley Guilherme dos Santos – Na minha opinião, o PFL – que é um partido laranja do PSDB – vai pedir o impedimento do presidente Lula, com ou sem base, no final das comissões de inquérito, portanto no fim do ano. O que significa que metade de 2006 estará envolvida no processo de impedimento do presidente. A oposição tem força no Parlamento para iniciar isso. É assim que, na minha avaliação, a oposição faz seus cálculos e é nesse contexto que estão esperando fazer uma campanha presidencial: com o Lula, que é o candidato mais forte, sendo submetido a um processo de impedimento. Quem vai votar nele pensando que poderá estar impedido mais à frente? É uma manobra suja, mas viável.

ISTOÉ – Se Lula ficar fora da disputa, quem se beneficia?
Wanderley – O PSDB é um sério candidato a chegar ao segundo turno. Mas não se sabe quem vai ser o candidato. Pelo passado, sabe-se que o José Serra tem suficiente capacidade destrutiva de concorrência dentro do partido e no final ser ele próprio o candidato. Isso trará um pouco de dificuldade de coalizão com o PFL, por conta do episódio Roseana Sarney (referência ao dinheiro flagrado na empresa Lunus quando ela era forte candidata ao governo em 2002). Mas acho difícil que outro candidato, dentro do PSDB, tenha chance de batê-lo porque Serra não tem limites. Ele é um político extremamente duro, hábil. Pela imagem pública transmitida, ele é o José Dirceu da máquina do PSDB. Não tem brincadeira com ele, domina mesmo. Agora, é preciso não esquecer que existe um candidato a candidato chamado Anthony Garotinho, que disputa dentro do PMDB.

ISTOÉ – Com que chances?
Wanderley – O PMDB, como sempre, vai rachado, seja qual for o candidato. Se o Garotinho sair pelo partido significa não só mais tempo de tevê, como também mais diretórios, a infra-estrutura nacional do PMDB. Ele não é um candidato fácil. Se Lula e Garotinho forem para a disputa, o PSDB vai ter que brigar pelo segundo ou pelo terceiro lugar com o Garotinho. Não se deve brincar com o Garotinho. Ele derrotou o Serra em seis Estados em 2002, com um partido que não tinha estrutura nacional. Ele chegou em segundo lugar em seis Estados, na frente do Serra. Desconsiderar o vetor Garotinho é não compreender bem a dinâmica que a competição presidencial pode ganhar. De repente, como aconteceu em alguns momentos da campanha passada, o PSDB pode ser obrigado a virar seus canhões contra o Garotinho.

ISTOÉ – E o caixa 2, como ficará?
Wanderley – Acho difícil deixar de existir porque faz parte da competição. Existe em todos os países democráticos nos quais a competição é acirrada. O problema é conseguir restringir isso, não expor partes fundamentais do Estado nesse jogo e, sobretudo, fiscalizar e punir. Não fazer vista grossa. Mas há que se perder a inocência, a pretensão de que é possível fazer uma legislação capaz de proibir o caixa 2. Esse caminho não leva a nada.

ISTOÉ – Afinal, o mensalão existe?
Wanderley – As coisas precisam ser provadas. O destino dos saques seria para pagar acordos de campanha. Mas para pagamento de votos no Congresso é algo que deve ser provado. Não digo que não existiu, apenas que tem que ser provado. Porém, antes que isso aconteça, a oposição aumentou a aposta na crise. Disse que o mensalão era coisa menor, e tornou mais relevante o fato de o PT ter ocupado o Estado brasileiro, estabelecido a corrupção sistêmica para financiar a perpetuação do partido no poder. Isso é uma senhora acusação. É preciso ter dados muito fortes para afirmar algo dessa gravidade. E o que acontece é que, até agora, nem mesmo questões elementares foram comprovadas. Como, por exemplo, se Renilda (mulher de Marcos Valério) mentiu. Aumentaram tanto as acusações, disseram que tantas coisas já estavam comprovadas e essas autoridades – presidentes e secretários das CPIs – não desautorizaram essas afirmações peremptórias. E, agora, se chegar à conclusão de que não houve, por exemplo, pagamentos regulares tendo em vista a compra de votos, como é que fica?

ISTOÉ – Como deveria ficar a situação dos acusadores?
Wanderley – Se eles mentiram para a opinião pública, difamaram colegas, afirmaram inverdades, caluniaram partidos, deveriam responder ao Conselhode Ética e perder o mandato.

ISTOÉ – Quem são esses deputados e senadores? Wanderley – Eu já mencionei e não gostaria de ficar repetindo como se fosseuma coisa pessoal. Mas todos sabem: são aqueles que se sentam na frente(na CPI), sãos os primeiros a falar, a esganiçar, são muito eloqüentes,enfáticos, e também são sempre os últimos a falar porque se reinscrevempara a despedida dos holofotes.

ISTOÉ – Esses parlamentares exercitam, para usar uma expressão criada pelo sr., a lógica do blefe? Wanderley – Não só eles, mas também líderes partidários. Incluo aí o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e os senadores Tasso Jereissati (PSDB-CE) e José Agripino Maia (PFL-RN). Eles afirmaram categoricamente que já está comprovada a existência da ocupação do Estado brasileiro e de um esquema de corrupção sistêmica para financiamento do PT. Se eles têm comprovação disso, têm que revelar. Se não aparecerem provas, são responsáveis por isso. Eu fico surpreso de ver pessoas com passado e currículo relevante fazer uma acusação dessa sem provar. Porque, se for verdade, se já há fatos comprovando indubitavelmente, não precisa esperar o fim da CPMI, tem de iniciar imediatamente o impedimento do presidente da República e eu sou favorável que comece logo. Agora, se não há, não pode dizer uma coisa como essa.

ISTOÉ – O que há de comprovado?
Wanderley – Isso é exatamente o que todos nós estamos pedindo! A emoção fica sendo administrada diariamente. Não querendo ser cruel ou irônico com a senadora Roseana Sarney (PFL-MA), o fato é que todo fim de semana inventam um “episódio Roseana”, curiosamente com o mesmo beneficiário, todo mundo sabe quem. Os episódios se sucedem e nada se comprova. A população fica nessa expectativa. Se os resultados da CPMI dos Correios não for uma hecatombe parlamentar, ninguém vai ficar satisfeito, independentemente da verdade dos fatos.

ISTOÉ – Aconteceram escândalos no governo FHC que não causaram amesma reação. Por quê?
Wanderley – Ponto um: porque praticamente toda a mídia era favorável a Fernando Henrique. Ponto dois: a oposição a FHC era muito frágil do ponto de vista parlamentar. Não tinha força para fazer valer no Parlamento o que PSDB e PFL estão fazendo agora, uma oposição forte. O que é bom para a democracia. Acabamos de saber que, ao investigarem o Instituto de Resseguros do Brasil (IRB) por conta do alargamento das investigações provocadas pela lógica do blefe, a grande falcatrua cometida lá ocorreu no final do período FHC. Eu duvido que o eixo do mal dos negócios das comunicações dê projeção a esse fato, apesar de comprovado pelo TCU. Duvido. Como não deu ao fato de que Marcos Valério contribuiu com caixa 2 na campanha de FHC em 1998.

ISTOÉ – Depois de três meses de crise, fica a sensação de que o Brasilacaba de descobrir que propina é uma prática política comum.
Wanderley – Está sendo perdida uma oportunidade fantástica de ir a fundonos esquemas ilícitos de relação entre o privado e o público no Brasil, queexiste e não é de hoje. O equívoco da oposição é insistir, por razões eleitorais,na tese de que isso é inédito e se restringe ao PT. Hoje, eu vejo a oposiçãocomo um obstáculo a uma séria investigação do problema. Não deviam ter partidarizado. A questão é o sistema privado seqüestrando pedaços do Estadopara operações ilícitas. Isso existe e tem que ser enfrentado. Podiam ter aproveitado a oportunidade e colocado o governo em cheque, pegando o fato de ser comprometido com a ética. Mas qual foi a estratégia eleitoral da oposição? Dizer que isso nunca houve. Ora, isso é um conto da carochinha!

ISTOÉ – O PT era considerado uma reserva moral. Isso aumenta o prazer em destruí-lo?
Wanderley – Sem dúvida. Estão pagando o preço por ter revelado que também sucumbiram a algo que englobou todos os governos passados na história da República, de 1945 para cá. Por que acontece isso no Brasil? Por que o brasileiro é naturalmente corrupto? Não, é pela própria formação da cumulação capitalista no Brasil. O sistema privado brasileiro é uma estrutura que depende dramaticamente de favores do Estado. Legislação de subsídio, de isenção de tarifa de importação... coisas sem as quais ele tem dificuldade de sobreviver. É um sistema que, por conta disso e das competições entre os diversos setores, seqüestra pedaços do Estado para obter benefícios, para obter legislação a seu favor. Isso é antigo e é seriíssimo.

ISTOÉ – O sr. é a favor do financiamento público nas campanhas?
Wanderley – Não. Primeiro porque não resolve nada e usa o dinheiro público. Sou a favor do financiamento aberto, online, o tempo todo, com limite e fiscalização séria.

ISTOÉ – Qual é o futuro do PT?
Wanderley – Não sei. Há dois PTs: o da organização e o das ruas. O segundo está aí e não vai desaparecer. Não vai certamente para o PSDB nem para o PFL. Uma parte pequena vai para o PSOL e um pedaço um pouco maior vai para o Garotinho. O PSOL é um partido que tem uma proposta pré-democrática. A democracia representativa não comporta um partido que não faz alianças ou só faz com quem pensa igual. É uma concepção de democracia autoritária. Mas acho que o PT vai se reformular e os petistas vão continuar no PT.

ISTOÉ – Estamos diante de uma suculenta pizza?
Wanderley – Acho que estamos diante de uma ameaça de arapuca. Pelo silêncio das autoridades das CPIs e, caso não se descubra nada, já, já vão estar entre ser cúmplice de uma história mirabolante e ceder à extorsão do eixo do mal do negócio das comunicações ou ser desacreditados. Não acredito em pizza. Se houver comprovação, virá a público. Não falo de caixa 2, isso já perdeu a importância. Fundamental é comprovar o valerioduto sendo alimentado por empresas estatais, com dinheiro no Exterior. O problema é se não houver provas. O que vão fazer?